O verdadeiro espirito de Natal

12.12.09

Hoje de manhã convidei-me a mim mesma para ir às compras. E lá fomos nós, eu e eu, para o centro de Madrid à procura de um presente de Natal. As lojas estavam lotadas e o ar condicionado no máximo. Então toca a tirar o gorro, o casaco, o cachecol e a camisola. Prova uma roupa, outra, esta não fica bem, aquela faz-me gorda e, de repente: “Onde está o meu casaco?” Procuro por aqui, por ali, por todos os sítios que estive e nada. “ Não há problema”, pensei, “os senhores da loja devem tê-lo arrumado”.
Estava eu então a dirigir-me à caixa para perguntar pelo digo abrigo quando reparo que há uma rapariga na loja a usar um casaco igual ao que eu tinha perdido.
Primeiro surpreendi-me, Que coincidência, disse para mim mesma, é um casaco tão velhinho e esta rapariga tem um igual. Mas depois parei.
Espera ai.
Comprei este casaco há quatro anos. Em Portugal. Qual seria a probabilidade de uma pessoa, em Madrid, ter o mesmo casaco que eu no exacto momento em que o meu desapareceu?
- Olhe, desculpe, esta pergunta pode parecer um pouco absurda, mas esse casaco que está a usar é seu?
- Claro que é meu, que raio de pergunta – diz a loirinha impertinente.
- É que eu acabei de perder um casaco igual a esse.
A rapariga muda de cor.
- Está a insinuar que eu roubei o seu casaco?
- Mmmm… sim e gostaria que mo devolvesse.
A conversa tinha subido de tom e os seguranças da loja aproximaram-se:
- Algum problema?
- Esta senhora roubou o meu casaco. Eu deixei-o numa prateleira, ela tirou-o, vesti-o e agora diz que é seu.
- A senhora pode provar o que está a dizer? – pergunta-me o segurança.
- Não, mas pode ver nas câmaras de vigilância
- Não temos câmaras de vigilância.
Isto não me podia estar a acontecer. Roubaram-me o meu próprio casaco, na minha cara, eu identifiquei o ladrão e agora não o posso recuperar? Queria chamar a polícia, mas “não vai servir de nada porque é a palavra de uma contra a outra”. Queria bater-lhe, puxar-lhe os cabelos loiros oxigenados, pisa-la, cuspir-lhe na cara.
- Senhor segurança, convenhamos, não é preciso perceber muito de moda para ver que esse casaco fica enorme a esta mulher. O casaco não é dela! Não vê que é o meu número?
Não, ele não via. E era melhor baixar o tom ou ele teria de me convidar a sair do estabelecimento.
Então fiz tudo de maneira instintiva: virei as costas, respirei fundo, escolhi um casaco novo, paguei, vesti-o e voltei a passar pelo meu casaco velhinho personificado de brasileira de cabelo oleoso:
- Olha, oh ladra, comprei um casaco novo – gritei-lhe da outra ponta da loja – muito mais giro que o que me roubaste. O meu outro casaco estava velhinho mesmo, pode ficar para ti, não faz mal, eu ofereço-to. Considera-o como um acto de caridade.

O Natal faz destas coisas. Ressuscita o lado mais solidário que há em nós.

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