O Fernando, parte II

10.12.09

- Ele sabe ler os lábios – tranquilizou-me o camera – basta que lhe fales sempre de frente e que separes bem as palavras.
Parecia fácil.
Depois de algumas tentativas falhadas e outras que foram salvas pela linguagem universal, concluímos: “É que os estrangeiros devem vocalizar as palavras de maneira diferente”.
Mas eu insistia, esforçava-me, vo-ca-li-za-va o melhor que podia e no final recebia sempre o mesmo sorriso com os indicadores a girar em espiral: “repete”. E eu, frustrada, repetia uma e outra vez, cada vez mais intensamente. O Sérgio, vendo o ridículo da situação, salvou-me enquanto me piscava o olho com um ar paternal:
- Marina, ele não ouve, não vale a pena gritares.
Corei pela segunda vez na mesma tarde.
A curiosa dupla de jornalistas trabalhava para um programa de linguagem gestual. A ideia era que os actores da nossa serie dissessem uma frase utilizando a “lengua de signos”. O Fernando era o professor. Ele explicava, pacientemente, cada gesto e a expressão fácil que este acarretava. Era preciso “dizer” tudo seguido, “como se fosse uma frase”, explicava o santo professor que nem sequer se importou que gozássemos com a palavra “actor” por parecer-se a um passo da “Macarena”. No final do vídeo, os actores deveriam ler em voz alta a frase que tinham acabado de “gesticular”.
Quando o primeiro actor acabou a sua leitura, pareceu-me que a voz off tinha ficado perfeita e resolvi perguntar:
- O que achas Fernando? Serve?
Então ele olhou para mim com uma enorme cara de burla e disse com a sua voz de soluços:
- Não sei Marina, é que não consegui ouvir.
E eu corei. Outra vez.

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