Cidadã a fingir

3.3.09

Não sei se todos sabem, mas eu nunca votei.
Logo eu que aos 18 anos deixei de falar aos meus amigos que ainda não se tinham inscrito para votar. Logo eu que me meto em todas as discussões políticas, que tenho sempre um candidato favorito e que no dia das eleições recuso qualquer convite para sair de casa. “Ser cidadão é um trabalho difícil”, costumo dizer como justificação.
Mas é que isto de ter várias nacionalidades e, ao mesmo tempo, não ter nenhuma, é uma tarefa complicada.
Oficialmente poderia votar em três países. Em Itália nunca me cheguei a inscrever, já que “como boa cidadã” que sou, não me parece bem andar a meter-me num país que não contribuo e cujas normativas não me irão afectar de forma nenhuma. No Brasil, como emigrante residente no estrangeiro, tenho direito a votar para Presidente. No entanto, quando transferi o meu direito de voto para Portugal houve um problema burocrático (de razão desconhecida) que me impediu de votar nas últimas eleições - e ainda tive de pagar uma multa!
Já em Portugal, o país onde eu realmente queria votar, não aceitam o meu voto. Teoricamente poderia votar em “tudo menos Presidente”, mas no dia em que cheguei às urnas para votar para Primeiro-Ministro, o meu nome não constava na lista. Problemas burocráticos, parte II, alegaram. Mas, desta vez, sem solução à vista:
- Tem de voltar aqui “mais perto das próximas eleições” e preencher o papel amarelo, depois ir entrega-lo ali ao lado, pedir um requerimento e, quem sabe, o problema se resolva a tempo de votar daqui a quatro anos. Mas olhe que as regras mudam muito. O melhor é ir passando por cá.
Desisti.
Estou agora no meu quarto país, adoptando a minha quarta não-nacionalidade e voltei a deparar-me com o mesmo problema. No domingo foram as eleições autárquicas, que na Galiza correspondem, em termos de importância para a região, às nossas eleições para Primeiro-Ministro.
Então hoje na aula apanhei-me a dizer:
- Foi por isso que eu votei … – parei, olhei a volta, escondi o corado das bochechas e corrigi, como se tivesse sido um erro de espanhol – Foi por isso que eu queria ter votado…
Mas a verdade é que eu durante todos estes anos de isolamento político aprendi a acreditar que o meu não-voto contou como qualquer outro para todas as decisões políticas. Que eu também elegi governantes, que também errei nas minhas escolhas e que também posso exigir que se cumpram as promessas que fizeram em campanha.
Eu posso ser uma cidadã a fingir, mas no fundo, sinto-me de carne e osso. E é por isso que digo sempre que se aproxima uma eleição: “Ser cidadão é muito difícil”.

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