Oposição

1.8.09

Uma das primeiras palavras que aprendi quando cheguei a Espanha foi o verbo “opositar”. Isto porque logo no primeiro dia na minha nova casa umas das raparigas que lá vivia contou-me que esse era o seu sonho. Nessa tal primeira vez tive vergonha de lhe dizer que não sabia o que significava a palavra e imaginei que tivesse algo que ver com formar parte de uma força da “oposição”. No segundo dia ela voltou a falar sobre o tema e comentou como era difícil “fazer oposição”. Pensei em todos os autores revolucionários que tinha lido ultimamente e concordei com ela. Mas à medida que o meu espanhol foi melhorando, fui apercebendo-me que esse tal trabalho que ela queria não era tão nobre quanto eu pensava. Então ela explicou-me:
- Opositar é fazer um exame para trabalhar para o governo, sabes? Trabalhas das 9 as 14h, ganhas bem e não te podem despedir. O melhor trabalho de sempre.
Ah, então ela queria ser funcionária publica… Mas em que área?
- Isso é-me indiferente. Não me importo de fazer qualquer coisa.
Fiquei chocada. Como era possível que o sonho da sua vida fosse ser funcionária pública? Sem mais. Não queria ser professora, contabilista, advogada ou notária do estado. Não queria cozinhar para o primeiro-ministro, ser polícia nacional ou cuidar de crianças necessitadas. O seu sonho era apenas pertencer a esse grupo de pessoas que “trabalha pouco, ganha bem e não pode ser despedido”.
O problema deste país é que, como essa minha amiga tinha comentado, é “muito difícil” conseguir esse trabalho. Simplesmente porque o sonho de todo o espanhol é ser funcionário público (alerta margem de erro!). O mais grave é que a sociedade parece ter chegado ao acordo comum de que trabalhar para o Estado, seja fazendo o que for, é o “melhor trabalho do mundo”. Já conheci pessoas que estão há três anos desempregadas estudando para fazer o tal exame, outras que estão a tirar um “curso qualquer” só para na altura de “opositar” receber um salário melhor e ainda houve outro que me tentou consolar: “Se não arranjares emprego como jornalista sempre podes voltar para o teu pais e opositar, com um mestrado ganhas mais!”
Eu tenho uma profunda implicância com os funcionários públicos. Isto porque numa verdadeira economia de mercado, um emprego que tenha mais segurança deveria, em termos teóricos, ser pior remunerado (é o que explica, por exemplo, o fenómeno dos free-lancers). Em Espanha (e em Portugal também) os funcionários públicos são os menos produtivos, os que têm menos horas de trabalho e são melhor remunerados de grande parte da população activa.
A única razão possível que encontro para isto é que como são tantos, ninguém se revolta. E ainda aproveitam para espalhar esse mito do trabalho de sonho para justificar a insignificância da sua existência.

Não se esqueçam de considerar a devida margem de erro, sim?

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