Descalça pela vida

6.7.09

Assim como quase todas as meninas, eu também cresci a achar que um dia iria encontrar um príncipe com um cavalo branco, que viveríamos num castelo e falaríamos a cantar.
Mas depois uma pessoa vai tropeçando pelo caminho e a vida vai deitando tudo ao ar. Descobrimos dolorosamente que os animais não falam, que a comida imaginária não alimenta, que os homens, ai os homens, nunca são tão perfeitos como gostaríamos. E até há aquele dia memorável em que nos dizem que os cavalos não podem andar na autoestrada.
Mas as lentes cor de rosa dos livros coloridos da infância são muito resistentes e há sempre qualquer coisa que fica, uma réstia de crença absurda e infantil na salvação e no amor eterno que não se dissolve na espuma de todos os dias, que dura no meio dos gritos, do mau humor, das noites mal dormidas, do fim do mês sem dinheiro e do trânsito parado.
Acreditamos porque queremos e também porque não suportamos não acreditar. O tempo passa e mal sabemos que tudo já se tornou impossível, que ao longo dos anos e das desilusões o que ficou foi a parte prática e não a romântica. Que o que nos mantém unidos ao amor é a certeza de que estaremos sempre melhor acompanhados do que sozinhos, descalços pela vida.
Há uns tempos atrás tirei os sapatos e as pedras da calçada fizeram-me feridas nos pés. Agora que os meus dedos começam a ganhar calos eu pergunto-me se isso será bom ou mau.

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