As doze uvas

5.1.10

Não havia resoluções e isso, só por si, já parecia diferente. Depois também não havia autocarros, mas esse pequeno obstáculo resolvemos interpreta-lo como um sinal. E então de volta a casa com o frio a trespassar o gorro e a instalar-se na cabeça. Menos mal que há televisão, dissemos. E convencemo-nos.
Ligámos o aquecimento e pusemos banda sonora. A tv ficava em mute por enquanto. Havia muitas retrospectivas e balanços que fazer. Mas ele não gostava disso, ficava nervoso, garantia. Então eu falava e ele ouvia, e comentava as parcelas das minhas histórias como se de um filme se tratasse. “Muito bom o teu ano”, concluiu, e eu disse-lhe que o dele também tinha sido, que era tudo uma questão de retórica e narrativa.
E conversa puxa conversa e lá vêm as badaladas. Televisão em On, prepara o copo e as uvas. Dizem que o principal objectivo é não engasgar.
- Mas é uma uva por segundo?
- Uma por badalada.
- E quanto tempo dura uma badalada?
- Não sei, mas treinar dá azar.
Como não havia resoluções, também não havia desejos. It’s a deal.
Então pé direito no chão e doze uvas alinhadas. Copo cheio e concentração em alta.
Uma, duas, três, quatro, cinco. Já estávamos com cara de engolir forçado quando percebemos que só agora tinham começado os sinos. O lado bom é que já só faltavam sete uvas e o mau é que umas quantas badaladas morreram de fome.
Sobrevivemos, mas agora resta saber se a tradição trampa funcionou ou se aquelas cinco badaladas esfomeadas vingar-se-ão em 2010. Quem viver, verá.

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