(quase)

Diz o Paul Mason que no futuro viveremos (quase) sem dinheiro e eu (quase) acredito.
Porque talvez não sejamos a geração perdida. Talvez não tenhamos uma vida pior que a dos nossos pais. Talvez tudo seja uma questão de perspectiva.
Jantar fora está "out" porque o que está "in" é cozinhar. Já não compramos sabão nem creme hidratante. Fazemos em casa. Na aldeia cultivamos kiwis e pimento picante. Vem dai um tomate da horta e cebolas caseiras. Os pais do meu amigo têm galinhas, os meus têm ameixas. Trocamos.
Vendemos aquela televisão que havia lá em casa e que só ocupaba espaço. Ganhamos quase cem euros e respiramos de alívio. Vens visitar a minha cidade? Alugo-te um quarto e faço-te o pequeno almoço.
As aulas de inglês, faço na escola pública e os livros e os filmes estão todos online. Nada de comprar pipocas de microondas, as de milho de verdade é que são boas.
Também é melhor o pão caseiro e o doce para o café da manhã. Almoçar numa esplanada em frente ao mar? É mais divertido un piquenique debaixo da árvore.
Se o meu vizinho tem internet, un "alargador de sinal" faz-nos a todos mais feliz. ¿Comprar fora dos saldos?, isso é gastar por gastar.
Talvez o que o Paul Mason queria dizer é que somos a geração dos forretas. Dos que compram as ferias com un ano de antecedência e vão por ai gabando-se do bom negocio. Se calhar o "gratis" é mesmo a nova forma de vida.
Ou (quase) a única vida possível.

O que mudou?

Não sei se fui eu ou foste tu. Se foi o mundo. Se foi um país sem presidente, o outro em processo de impeachment e o terceiro a governar em minoría. Quiçá nada mudou.
Mudou o ritmo das tardes de domingo. Os hobbies. As noites demasiado cansadas a dormitar no sofá. Porque o sofá, definitivamente, não mudou.
Quiçá deveria. Deveríamos ter mudado o sofá e a factura do banco. Ter expulsado a preguiça e melhorado a nossa organização. Deveríamos comer melhor. Mas isso não mudou.
Não mudámos com a distância nem a convivencia. Com os whatsapps descompasados. Con o jetlag e as ligações frustradas. A saudade não nos mudou. Deveria?
Mudou, talvez, o sorriso. A postura. O olhar. Mudou, quem sabe, o futuro. Mas isso só o futuro sabe.
Mudou a tranquilidade, o silêncio, o chá de menta fresca. Isso, definitivamente, mudou.
Aquela gargalhada entre paredes cinzentas e o respirar fundo. Mudou a profundidade da minha respiração. Isso sim.
Tudo mudou para não sair do lugar. Ou esse lugar nunca foi seu. Ninguém saberá o que teria sido se nada tivesse mudado.
Essa é a verdade.

Isto é uma declaração de amor.

Sete meses. Um pouco mais. Exatamente sete meses e sete dias. Curioso.
10 países e três capítulos. Sempre com um verbo em conjugação automática: recomeçar.
Foram 220 dias de solidão acompanhada, de uma "viagem interior" diriam os mais "cursis".
- Mas foste sozinha? - É uma das perguntas mais frequentes. Deveria responder que sim. Sem amigos ou namorado. Sem agenda nem compromissos.
Mas não.
Ela foi a minha companheira incansável. Quem soube encher com um clic o silêncio dos días mais duros. Fez terapia a través da sua lente. Com ela passei dias inteiros debaixo de um calor de 40 graus, vi o mundo em verde (demasiado tempo) e fiz o que melhor sei fazer: perguntar.
Insultei-a (inevitável em qualquer situação). Protegi-a da chuva e do vento. Não se livrou de algumas cicatrizes de guerra.
Até fizemos amigos depois de um "qual é a marca da tua?".
A minha é uma LX100. "Camarita", para os mais próximos. Foi a minha acompanhante durante estes 7 meses e 7 dias. E, sim, isto é uma declaração de amor.

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